quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Resenha do novo RPG da Marvel

Quem acompanha o blog ou meu twitter já viu várias menções ao novo rpg da Marvel, o Marvel Heroic Roleplaying Game. Para quem não viu, ele é o mais novo rpg da Margaret Weis Productions, dona do sistema Cortex e do seu derivado e versão mais atual, o Cortex Plus.

O Cortex Plus é um esqueleto de sistema que é adaptado a cada nova licença que é adquirida pela empresa. Atualmente o jogo tem três linhas separadas, Smallville RPGLeverage RPG e o Marvel Heroic Roleplaying. Todos tem certas similaridades, como a ênfase em simular o tipo de história vista naquele gênero e não um universo mensurável e independente dos personagens-jogadores, como alguns outros jogos tentam.

O MH RPG segue esse princípio. Em vez de tentar simular o universo Marvel, ele tenta simular as histórias que ocorrem no universo Marvel. Essa é uma diferença importante e que influencia no design de todo o resto do jogo.
Outros jogos de super-heróis tendem a dividir os personagens em listas de valores e habilidades fixas, precisas e comparáveis. Uma ficha do Hulk teria os valores de força do personagem, quanto ele é capaz de levantar, qual a distância ele é capaz de arremessar algo. No modelo de design do MH RPG, essa precisão não é importante. A única coisa que importa é o que o Hulk faz com essa força nas suas histórias.

Se nós fossemos representar a força do Hulk em MH RPG, o primeiro passo seria construir umpower set pra isso. Power sets são conjuntos de power traits, como o jogo chama os poderes, agrupados juntos para representar as habilidades dos personagens. Além de power traits, power sets também são compostos por SFX, características que permitem maior personalização, eLimits, fraquezas ou formas de anular o poder dos personagens.

Como só vou usar essa construção da Super-Força do Hulk como exemplo, vou me concentrar somente no power trait Strength (Força). Se eu estivesse construindo a ficha do Hulk, provavelmente seria interessante incluir power traits para aumentar a resistência dele (Durability e Stamina), um para dar aqueles pulos gigantes (Leaping) e provavelmente mais alguns que fãs são capazes de pensar.

Todos os power sets tem nomes evocativos. Já que estamos falando do Hulk, que tal ‘Puny humans!’. Faz sentido, é divertido e ajuda a colocar no clima certo.

Agora eu olho no livro a descrição do poder Strength. Não existe tabela indicando diferentes níveis de força junto com um cálculo valor x peso. Você tem o segundo nível de força? Você arremessa carros nos outros. Não existe fórmula para indicar o quão longe algo é arremessado com determinado nível de força. Você tem o último nível de força? Um soco teu pode jogar alguém em órbita. Em vez de precisão numérica, os diferentes níveis tentam indicar que tipo de ações típica dos quadrinhos um personagem poderia realizar.
Mecanicamente, o que os diferentes níveis representam são dados diferentes a serem adicionados a parada de dados que formam o sistema de resolução de ações do sistema. Alguns poderes tem regras específicas, mas esse é o padrão para a maioria. Se o jogador conseguir justificar o uso do poder numa determinada ação, ele usa o dado correspondente na parada de dados.

E aqui é um bom momento para explicar como funcionam as jogadas para quem não leu os previews do jogo. Todas as ações do sistema são resolvidos com paradas de dados formadas pelas características do personagem e mais quaisquer outros dados que possam ser criados através de ações específicas (como ajudar um colega a derrubar uma porta). Os dois maiores dados são somados e esse valor é comparado contra uma parada de dados do Watcher (o mestre do jogo). Caso o valor obtido pelo herói seja maior, ele é bem sucedido. Então o terceiro maior dado dela indica o grau de efeito conseguido. Quanto maior o dado utilizado nesse efeito, mais bem sucedida foi a ação.


As características usadas variam, mas uma que sempre entra nas jogadas é a Affiliation. Ela reflete quão eficiente o personagem é quando trabalhando sozinho (Solo), com um aliado (Buddy) ou numa equipe (Team). Personagens que costumam lidar com os problemas sozinhos (como Wolverine ou Batman) normalmente vão ter Solo mais alto do que Buddy ou Team. Personagens como o Ciclope ou o Capitão América estariam no extremo oposto, sendo melhores quando trabalhando com uma equipe.


Outras características que incluem dados na parada além da Affiliation e dos power traits, são asDistinctions e as Specialties.

Specialties são o correspondente as perícias do jogo, áreas de conhecimento que o personagem domina. Elas são amplas, de forma a permitirem vários conceitos diferentes de personagem. Assim, tanto um criminoso como Jigsaw quanto um advogado como o Demolidor tem a specialty Crime, pois os dois tem conhecimento sobre leis e atividades criminosas. O que muda é como eles utilizam essa especialidade. Enquanto o inimigo do Justiceiro vai usar da specialty para planejar seus crimes e conseguir capangas, o Demolidor vai usar dela para saber quem pode ter cometido um certo assalto e com quem ele deveria falar para conseguir mais informações sobre uma nova gangue.

Distinctions representam aspectos como personalidade, atitudes ou comportamentos que são marcas registradas do herói. Novamente, os nomes são evocativos para ajudar a colocar o jogador dentro do conceito do personagem. Não existe lista para escolher, em vez disso os próprios jogadores criam suas distinctions.

Pegando um personagem famoso como exemplo, uma das distinctions do Wolverine é “I´m the best there is at what I do”, uma das frases mais conhecidas do personagem. Mecanicamente, distinctions são usadas sempre que o jogador puder explicar como esse aspecto vai influenciar a resolução de uma ação, seja positiva ou negativamente. Se for de uma forma positiva, ele ganha um dado d8 para somar a rolagem. Se for de uma forma negativa, ele ganha um dado d4 para somar a rolagem e um plot point, um tipo de recurso que o jogador pode usar para ativar certas habilidades especiais de poderes ou melhorar suas rolagens.
Mas porquê o d4, deve ser a pergunta na cabeça de algumas pessoas? Porque não uma penalidade na jogada? Porque o sistema usa a mecânica de Opportunities. Sempre que alguém tira um 1 num dado, a pessoa gera uma opportunity: o dado não pode ser utilizado no resultado final e ele pode ser ativado dando um plot point para quem tirou esse resultado. Então usar dados com menos faces (como o d4), aumenta a chance de tirar um 1 num deles.

Ativar uma opportunity pode ser usado para diversos efeitos, desde recuperar poderes que foram desligados por algum motivo quanto realizar feitos impressionantes. Essa é uma das mecânicas que existe em todos os jogos do Cortex Plus, mas que os detalhes variam entre cada um deles. Mas algo sempre que se mantém: quando um jogador tira 1 no dado, as coisas vão ficar mais difíceis. Quando o mestre tira 1 no dado, é a vez dos jogadores respirarem mais aliviados.

Essa seria uma definição resumida das mecânicas mais usadas no sistema. Ele tem várias mecânicas menores com funções mais pontuais, mas que podem ser resumidas assim: a maioria das mecânicas do jogo envolvem acumular mais dados ou conseguir dados melhores, mas sempre com um custo. Seja plot points, seja um risco maior de tirar 1 nos dados. Isso faz com que o jogo leve a várias decisões estratégicas quanto ao risco a ser enfrentado. O quanto o personagem iria arriscar para vencer um certo desafio? Até onde ele está disposto a ir para vencer seu grande inimigo?

Dois problemas que notei que algumas pessoas sentiram no Marvel RPG se referem a mudança na forma de resolução de ações quando comparada com outros jogos e a atitude cooperativa esperada.

O sistema é mecanicamente leve depois que você entende o funcionamento básico (tudo gira em torno da parada de dados e como conseguir mais deles), mas com uma profundidade que vai sendo percebida aos poucos e um sistema que foge bastante do padrão na resolução das ações. A maioria dos jogos usa rolamento de dados, mas como uma forma de gerar um modificador aleatório a ser somado, subtraído ou comparado a modificadores fixos já existentes na ficha ou definidos por tabelas de dificuldade. O Marvel RPG não faz isso. Em vez de ganhar bônus e penalidades em número fixos, eles são ganhos na forma de modificações nos dados utilizados. Bônus são dados extras ou com mais faces que o jogador ganha, penalidades são dados extras que os adversários ganham quando rolam contra o jogador ou a diminuição no número de faces dos dados usados pelo jogador. É isto que ganhar dados, usar dados com mais ou menos faces ou dar dados para o adversário representam.

Ele é talvez o jogo mais mainstream entre todos os jogos do Cortex Plus, mas ele ainda é narrativista. Isso é percebido claramente na forma de criação de personagens. Ela favorece a criação de ficha de personagens que já existem, pois não existe pontuação básica para distribuir. Em vez disso, os jogadores definem em conjunto com o mestre como serão seus personagens, com base em certas diretrizes. Isso é um processo colaborativo forte, que funciona bem em grupos onde o contrato social entre jogadores e mestre é claro e todos entendem que estão ali para se divertir e ajudar os outros a se divertirem. Ou como eles definem em outro livro do sistema, todos são responsáveis pela diversão de todos.

Esse é o tipo de sistema que vai funcionar em alguns grupos, mas não em todos. Certas pessoas preferem um sistema mais que defina e limite mais claramente o que os personagens podem fazer. Algumas pessoas preferem jogos com um aspecto de competição mais forte entre jogadores. E certas pessoas querem construir seus personagens de forma a conseguir comparar com precisão quem é mais forte, mais rápido, mais resistente. Esse não é o jogo ideal para essas pessoas.

Ou usando Mutantes & Malfeitores, um jogo que eu amo, para esclarecer melhor. M&M é o jogo ideal quando você quer uma campanha onde se procura uma simulação melhor da realidade onde ocorre o jogo e das características exatas dos personagens. Marvel Heroic Roleplaying é o jogo ideal quando a campanha é mais focada para a criação de cenas típicas de quadrinhos e a simulação do gênero. Os dois são ótimos, os dois são divertidos, mas atendem necessidades diferentes. O que faz com que algumas pessoas prefiram um ou outro. Eu gosto dos dois.

Devo começar uma campanha nesse final de semana, se tudo der certo. Vou poder testar o sistema, só que já adianto que gostei muito do que li. Ele se encaixa bem na proposta que tenho e me deu algumas idéias novas (como milestones e unlockables, que acabei nem explicando nessa resenha). É um jogo que valeu a pena e está baratinho, só 12 dólares pelo pdf noDriveThruRPG.

Logo que conseguir mestrar coloco aqui o diário de campanha. Também estou com algumas idéias de apoio visual para o jogo, logo que conseguir testar falo mais delas.

Via Pôneis Rider Blog

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